Maioria do Conselho Federal de Medicina apoia descriminação do aborto até 12ª semana de gestação; assim, também ela acha, a exemplo de certa comissão, que feto de gente é inferior a ovo de pardal
A cultura da morte avança. Leio na Folha
o seguinte título: “Médicos defendem aborto até 12ª semana de
gestação”. Indaguei cá comigo o óbvio: “Quais médicos?”. Segundo informa
Johanna Nublat, “o entendimento foi aprovado pela maioria dos
conselheiros federais de medicina e dos presidentes dos 27 CRMs
(Conselhos Regionais de Medicina) reunidos em Belém (PA) no início do
mês”. O texto não informa de quanto é essa “maioria” dos conselheiros
federais nem quais são os conselhos regionais que a endossam. Ficamos
sabendo que um terço dos CRMs não concordou — entre eles, o de Minas.
Se conseguir detalhes, informo aqui. Vamos lá.
Entre os
defensores da legalização do aborto até a 12ª semana está o próprio
presidente do Conselho Federal de Medicina, Roberto D’Ávila. “Defendemos
o caminho da autonomia da mulher. Precisávamos dizer ao Senado a nossa
posição.” Uma boa forma de esconder o fato de que o aborto implica a
morte do feto é falar em “autonomia da mulher” — afinal, quem pode ser
contra essa autonomia? Doutor D’Ávila é médico. Salvar vidas é a
essência do compromisso ético de sua profissão. Das duas uma: ou ele não
concorda com isso, ou acha que u feto não vive. Não há uma terceira
hipótese.
“Precisávamos
dizer isso ao Senado”, afirma ele. Ao Senado? Ele está se referindo
àquele projeto aloprado de reforma do Código Penal, elaborado por uma
comissão formada pelo senador José Sarney (PMDB-PA), que tramita na
Casa. É aquele texto que considera mais grave abandonar um cachorro do
que abandonar uma criança. É aquele texto que, ao definir uma quantidade
que caracterizaria tráfico de drogas, acaba, na prática, por
legaliza-lo. É aquele texto que banaliza a eutanásia (parece que doutor
D’Ávila nada tem a dizer a respeito). É aquele texto que reconhece como
legítimas ações terroristas praticadas por movimentos sociais. É aquele
texto que quer mandar para a cadeia quem desfaz um ninho de passarinho,
mas deixa sem punição quem mata fetos humanos. Donde se conclui que,
para seus formuladores — e, desconfio, também para o doutor D’Ávila —,
existe uma hierarquia entre o ovo do pardal e o ovo de gente…
Dr.
D’Ávila perfila-se, assim, com um texto eticamente asqueroso. Mas, como
ele confessa, “precisávamos (eles) dizer isso ao Senado”. Ok, doutor,
está dito! O senhor também acha que ovo de pardal é superior a ovo de
gente. Está plenamente compreendido. Só não queira escapar imune à
lógica, doutor. Não tentarei lhe prova que o feto é vida porque essa
aula quem deveria me dar é Vossa Senhoria. O senhor prefere, no entanto,
ignorar essa evidência em nome da, como é mesmo?, “autonomia da
mulher”. Então o senhor não seja intelectualmente covarde e defenda o
aborto na sua plenitude.
Se é a
autonomia da mulher que conta, até que o feto não seja expulso do ventre
materno ou de lá não seja retirado por uma cesariana, quem tem o
comando é a mãe. Por que, então, essa história de “12 semanas”? Seja
corajoso, doutor; faça como aqueles dois acadêmicos italianos que
defenderam o assassinato também de recém-nascidos. Afinal, também o feto
que acaba de sair do útero é um nada, certo? Ousados, eles escreverem
um artigo intitulado “After-birth abortion: why should the baby live?’ –
literalmente: “Aborto pós-nascimento: por que o bebê deveria viver?”. O
texto asqueroso foi publicado no “Journal of Medical Ethics”. Escrevi um post a respeito
no dia 2 de março do ano passado. O casal é potencialmente homicida,
mas lhe assiste certa razão prática: os motivos evocados para justificar
o aborto não são muito distintas dos evocados por eles para justificar o
assassinato de recém-nascidos. Doutor D’ Ávila deve saber que, assim
como não existe meia gravidez, também não existe meia vida humana, não é
mesmo? Se o feto não é coisa, então é vida. Dia desses tentaram me
convencer que, até o limite de 12 semanas, o feto não sente dor. Uma
galinha sente dor quando abatida, suponho, e não defendo a
criminalização da morte de galinhas. Não é a existência da dor que
define uma vida humana.
Na Folha, Claúdia Collucci escreve um artigo apoiando o CFM — há um outro crítico. Afirma ela: “A
decisão do CFM (Conselho Federal de Medicina) de apoiar a proposta de
descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação é corajosa, mas
tende a enfrentar resistência no próprio quintal–entre os médicos.”
Ai, ai… “Corajosa” por quê? Corajosa contra quem? O que há de corajoso
em interromper a vida? Não sei. A propósito: defender a posição
contrária também entra na categoria da coragem ou aí já seria covardia?
Segundo
a autora, nos países em que há descriminação do aborto, há menos
ocorrências do que naqueles em que ele é proibido. Reproduzo trecho:
“A favor dos que defendem a descriminalização, estão pesquisas recentes mostrando que as mais altas taxas de aborto estão justamente em regiões com leis restritivas.
Um estudo publicado na revista médica “The Lancet” no ano passado analisou dados de 1995 a 2008 e revelou que na América Latina, onde a maioria dos países criminaliza a interrupção da gravidez, estão concentradas os maiores números.
Em 2008, uma média de 32 entre 1.000 mulheres latino-americanas (entre 15 e 44 anos) abortaram. No mesmo ano, a taxa na África foi de 29. Na Europa Ocidental, onde a lei é mais permissiva, o número é de 12 a cada 1.000.”
“A favor dos que defendem a descriminalização, estão pesquisas recentes mostrando que as mais altas taxas de aborto estão justamente em regiões com leis restritivas.
Um estudo publicado na revista médica “The Lancet” no ano passado analisou dados de 1995 a 2008 e revelou que na América Latina, onde a maioria dos países criminaliza a interrupção da gravidez, estão concentradas os maiores números.
Em 2008, uma média de 32 entre 1.000 mulheres latino-americanas (entre 15 e 44 anos) abortaram. No mesmo ano, a taxa na África foi de 29. Na Europa Ocidental, onde a lei é mais permissiva, o número é de 12 a cada 1.000.”
Esse tipo
de raciocínio é fabuloso! Ainda que esses números sejam verdadeiros,
apontem uma só razão, uma só implicação racional e lógica, para que se
façam menos abortos em países onde a prática é descriminada. Muito
provavelmente, há menos ocorrências na Europa ocidental porque há mais
educação, mais saúde, mais renda… Para que a hipótese fosse ao menos
examinada, seria preciso comparar países em igual estágio de
desenvolvimento e com condições sociais semelhantes, mas com legislações
distintas. E, ainda assim, seria preciso ver a coisa com cuidado porque
há fatores de outra natureza, como os culturais e religiosos.
É uma
sandice, uma estupidez — e se costuma fazer o mesmo raciocínio falacioso
em relação à descriminação das drogas — sugerir que uma legislação que
facilita determinada prática concorre para a sua diminuição. Sei que o
argumento enfurece muita gente, mas não há como evitá-lo: leis que
descriminassem a pedofilia e o estupro poderiam ter o efeito positivo de
provocar a diminuição de ocorrências, ou esse raciocínio especioso só
vale para o aborto e as drogas ilegais? “Ah, são coisas diferentes.”
Claro que são! Eu estou é me ocupando do princípio que sustenta a tese.
O texto
volta à ladainha de que há, por ano, um milhão de abortos provocados no
Brasil. Bem, isso é chute militante. Se alguém me disser de onde sai
esse número, qual é a fonte, aí começo a examinar a questão. Hospitais
públicos e privados não dispõem de um formulário, ficha ou algo assim
que informe: “curetagem decorrente de aborto provocado”. Essa é mais uma
das mentiras que se espalham por aí, como aquela, que circulava até
outro dia, que sustentava que 200 mil mulheres morriam por ano vítimas
de abortos clandestinos.
Segundo
uma pesquisa do Instituto do Coração, da USP, entre 1995 e 2007, a
curetagem depois do procedimento de aborto foi a cirurgia mais realizada
pelo SUS: 3,1 milhões de registros. Observem: 3,1 milhões de
procedimentos em 13 anos. E é impossível saber o que é aborto provocado e
o que é aborto espontâneo. Aquele milhão é número mágico, militante,
sem base na realidade.
Os
defensores do aborto têm de deixar de ser covardes e defender o seu
ponto de vista sem ficar apelando para falsas questões. Este blog
aguarda, e publicará com destaque, um texto demonstrando por que a
legalização ou descriminação de determinada prática implicaria a
diminuição de sua incidência.
Vi aqui: Blog/reinaldo
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