CANSEI DE SER CHAMADO DE IDÓLATRA
Não consigo ficar em dúvida. Busco a causa, vou às fontes pra poder
entender tudo aquilo que, às vezes fica difícil entender. Sempre fui assim.
Nunca aceitei explicações pela metade e por isso não me contento com explanações
rasas e sem fundamento. Estou dizendo isso, porque me cansei de ouvir tanta
bobagem em torno das imagens que a minha Igreja conserva com tanto carinho. Já
não suporto mais as manipulações da Bíblia para jogar na cara dos católicos de
que somos idólatras. Cansei de ser desrespeitado na minha fé e ser chamado de
idólatra. Não aceito que me aviltem tentando desqualificar a minha fé. Alto lá,
você não está falando de uma instituição criada há alguns meses. Estamos
falando de uma instituição de dois mil anos. Estamos falando sobre uma
instituição que criou o método científico, desenvolveu o estudo da genética,
criou as universidades e hospitais, civilizou a Europa, desenvolveu o estudo do
Direito, vasculhou os céus e desenvolveu a astronomia, deu ao mundo os maiores
filósofos e cientistas. E, continua sendo, como sempre foi, a maior instituição
caritativa do planeta. Ora se não bastasse tudo isso, foi fundada pelo próprio
autor da fé, Jesus Cristo. Então não aceito a pecha de idólatra, só porque tenho
as imagens em gesso ou madeira daquela que foi a Mãe de meu Salvador. Não
aceito que me desrespeitem porque trago a cruz na qual meu Senhor morreu para
me salvar e nem aceito que me critiquem porque tenho os santos, modelos de vida
e de entrega ao amor de Deus. Se os tenho representado nas imagens, fotografias
e esculturas é porque a própria Bíblia me ensinou assim. Afinal, foi o próprio
Deus que pediu a Moisés que fizesse uma “imagem” de uma serpente de bronze para
que as pessoas, ao olharem, ficassem curadas. Não estou inventado, confira lá:
“e o Senhor disse a Moisés: Faze para ti uma serpente ardente e mete-a sobre um
poste. Todo o que for mordido, olhando para ela, será salvo.” (Números 21, 8).
O mesmo Deus pediu que se fizesse duas imagens de anjos e colocassem sobre a
arca da Aliança; confira de novo: “Farás dois querubins de ouro; e os farás de
ouro batido, nas duas extremidades da tampa, um de um lado e outro de outro”
(Êxodo 25, 18). Vamos mais a alguns exemplos de que a própria Bíblia pede que
sejam feitas imagens: “Farás o tabernáculo com dez cortinas de linho fino
retorcido de púrpura violeta, púrpura escarlate e de carmesim, sobre as quais
alguns querubins serão artisticamente bordados.” (Êxodo 26, 1). A Bíblia
instruiu para que as cortinas do tabernáculo tivessem imagens de anjos
bordadas. Além disso pediu que o véu também tivessem imagens de anjos
artisticamente bordadas: “Farás um véu de púrpura violeta, de púrpura
escarlate, de carmesim e de linho retorcido, sobre o qual serão artisticamente
bordados querubins.” (Êxodo 26, 31).
Mas e a condenação que está em Êxodo? “Não farás para ti escultura, nem
figura alguma do que está em cima, nos céus, ou embaixo, sobre a terra, ou nas
águas, debaixo da terra”(Êxodo 20,4). A Bíblia é um livro pra ser lido na sua
totalidade e jamais isolando versículos. A manipulação da Palavra de Deus vem
dessa prática perversa, a de escolher uma palavra e, sem considerar o todo,
transformá-la em lei. Isto se chama fundamentalismo que é fruto da má-fé ou da
ignorância. A Bíblia não pode ser lida por partes como se fosse um monte de
palavras jogadas ao vento. A Bíblia não são palavras. Ela é a Palavra. Uma só
Palavra de Deus que nos leva ao amor e à salvação, por isso lê-la extraindo
dela só o que nos convém é desonestidade. O texto que condena a fabricação de
esculturas é antecedido por dois outros versículos: “Eu sou o Senhor teu Deus,
que te fez sair do Egito, da casa da servidão”.(Êxodo 20,2) e “Não terás outros
deuses diante de minha face”.(Êxodo 20,3). Ora, a proibição não é em relação à
escultura em si, mas daquilo que a escultura representava para eles. Naquele
momento de travessia do deserto, o povo se deixava levar por ídolos e
acreditava que estes ídolos habitavam em algumas esculturas que eram comuns em
outros povos. Por isso a afirmação de Êxodo 20,4 é uma condenação à idolatria,
que seria trocar o Deus verdadeiro por aqueles ídolos que eles acreditavam
habitar nas esculturas. O problema não são as imagens, mas o que eles
acreditavam ser as imagens.
Esta condenação ainda é válida, pois não devemos trocar o Deus
verdadeiro por qualquer outro deus – isto, sim, seria idolatria. Mas a
idolatria pode acontecer não somente em relação à imagem. Alguém que troca Deus
pelo dinheiro é idólatra. Alguém que coloca uma pessoa no lugar de Deus é, da
mesma forma, idólatra. Assim , o jogo, a bebida, o time de futebol, podem se
tornar idolatria, basta que isto tome o lugar de Deus.
A Igreja católica, há dois mil anos, prega contra a idolatria e foi
essa Igreja que se levantou contra as terríveis heresias nos primeiros séculos
do cristianismo. De combate à idolatria, a Igreja entende. Por isso quando um
católico reza perante uma imagem ele tem plena consciência que está
simplesmente diante de uma imagem, da mesma forma que vejo uma fotografia de
alguém e relembro a sua trajetória.
Enquanto escrevo esse texto, tenho ao meu lado o jornal que estampa a
figura de Margaret Tatcher, ora, sei que a baronesa Tatcher não está neste
papel e tinta, é somente uma representação, no caso gráfica, de um rosto. Mas
ao olhar para esta foto recordo-me de tudo que esta mulher fez pela Inglaterra
e pelo mundo naqueles anos em que foi Primeira-Ministra. Assim quando olho para
uma imagem de alguém que viveu e testemunhou a sua fé sinto-me fortalecido e impelido
a imitá-lo. Assim são nossos santos, modelos de virtude e fé. É simples assim,
não há idolatria. Há sim, respeito pela memória de alguém que viveu plenamente
e se tornou modelo para minha vida. Diante de minha mesa de trabalho
carinhosamente olho, neste momento, para uma imagem da Mãe de Jesus, volto-me e
olho para São José que foi escolhido por Deus para cuidar de seu filho que
nasceria em Belém, ainda olho para uma outra imagem de São Judas Tadeu, fiel
apóstolo do Senhor, ao seu lado uma imagem de São Francisco, homem que viveu na
pobreza pois entendeu que a única riqueza era estar em Deus. Como me faz bem
olhar para essas imagens, pois me sinto com mais vontade de imitá-los para me
aproximar mais do Senhor. E por falar nisso, em minha frente há um crucifixo, é
como se Jesus estivesse ali me dizendo que se entregou por amor a mim. Que bom
que tenho sempre essas imagens me lembrando daquilo que eu não posso jamais
esquecer.
Padre Juarez de Castro
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