20 março 2015

Papa Francisco e o orgulho de ser Católico


No dia 13 de março de 2013, da varanda da Basílica de São Pedro, o Cardeal Tauran disse: ‘Habemus Papam'; e que ‘José Mario cardenal Bergoglio’ era o novo pontífice com o nome de Francisco. Daquele então até hoje mudou algo na Igreja?, Qual é a percepção e a realidade? ZENIT perguntou para o correspondente espanhol na Itália, que não faz descontos ao Vaticano, Pablo Ordaz, do jornal El País, que tem sido um correspondente no México, América Central e Caribe, e cujas respostas compartilhamos com os nossos leitores.
ZENIT: Desde o começo do pontificado do Papa Francisco, você acha que algo mudou na imagem da Igreja?
- Pablo Ordaz: Com certeza. Tanto do ponto de vista dos católicos como do resto da opinião pública. Não podemos nos esquecer que faz só dois anos que o Vaticano estava imerso em guerras de poder que levaram à fuga de documentos do caso Vatileaks, à detenção do mordomo de Bento XVI, à demissão descarada do chefe do IOR, aos escândalos contínuos de pederastia, à renúncia de Joseph Ratzinger… Em um tempo recorde, Jorge Mario Bergoglio conseguiu que os católicos, na sua grande maioria, voltassem a se sentir orgulhosos da sua Igreja – é só olhar para a Praça de São Pedro cada quarta-feira e cada domingo ou o interesse que causam as suas viagens – e que líderes mundiais como Barack Obama tenham vindo a Roma para visita-lo e dizer: “É necessário escutar o Papa”. A sua mensagem social em um momento de crise e sofrimento para muitas pessoas em todo o mundo está chegando com força.
ZENIT: Tem sido somente uma mudança de imagem ou foram mudanças reais?
- Pablo Ordaz: Eu acho que o segundo está ligado ao primeiro. Após aquela frase de abertura de seu pontificado – “como eu gostaria de ter uma Igreja pobre para os pobres” – Bergoglio está tentando, embora não sem resistência interna, lançar luz sobre as tradicionais escuras finanças vaticanas, racionalizar gastos, contagiar a Cúria e as diversas congregações, do seu estilo simples de vida, ir à busca dos feridos – divorciados recasados, novos casais, gays… – em vez de ficar protegido na comodidade. Mas, não é fácil. A inércia de muitos séculos nos contemplam e é mais simples acostumar-se a ser rico do que a ser pobre… como também não é fácil que depois de décadas olhando para outro lado, a Igreja, em seu conjunto, esteja se convencendo de que a “tolerância zero” é a única resposta à pederastia. Embora tarde, começa-se a dar passos nesse sentido.
ZENIT: Como você acha que isso foi vivido no Vaticano?
- Pablo Ordaz: Muitos ainda não se recuperaram da surpresa. Não tanto da surpresa de ver na varanda aparecer um Papa vindo do fim do mundo, com sapatos gastos, uma cruz de prata e pedindo para fieis reunidos em São Pedro que rezassem por ele, mas da surpresa de que não se tratasse só de gestos, pura propaganda, maquiagem para cobrir as feridas… Já não há dúvida de que Bergoglio está disposto a muda a Igreja para sempre, que sabe que tem pouco tempo e que, portanto, vai fazê-lo custe o que custar e doa a quem doer. Perante isso, só existem duas opções, ou ajuda-lo na empresa ou expor-se a ser arrastado pelo furacão. Está claro que existem resistências – e aí estão os vazamentos dos últimos dias sobre as supostas extravagâncias do Cardeal George Pell – , mas, acho que, no geral está conseguindo o que quer.
ZENIT: De vez em quando o Papa usa palavras e imagens claras, mas politicamente incorretas. Como você vê isso?
- Pablo Ordaz: Dizia o escritor Ennio Flaiano que, na Itália, a linha mais curta entre dois pontos é o arabesco. A Igreja oficial, tão vinculada à Itália para o bom e para o mal, abusou muito do arabesco, das mensagens cifradas, para dirigir-se aos fieis. O resultado foi, muitas vezes, um corte de comunicação, uma distância intransponível entre os doutores da Igreja e os católicos a pé. O resultado – ou um deles – pode ver-se na fuga, especialmente na América, de centenas de milhares de católicos para outras confissões. Bergoglio prefere falar cara a cara, dar-se a entender, sair do roteiro, apelar para a emoção quando fala das mães que perdem os seus filhos no mar de Lampedusa e até mesmo critica abertamente quando fala da cara de enterro ou da vida mundana de alguns sacerdotes e freiras. E, às vezes, alguma dessas suas frases, analizadas de forma isolada, sem o contexto apropriado ou o filtro do politicamente correto, podem causar polêmica. Mas, tenho a impressão de que Francisco prefere errar e chegar nas pessoas do que elaborar discursos frios e distantes.
ZENIT: O Papa Francisco fala muito de Jesus, das parábolas do Evangelho…
- Pablo Ordaz: Sim, me chama muito a atenção de que os discursos do Papa – cuja cópia original nos envia a secretaria de imprensa do Vaticano – estejam cheios de referências constantes às escrituras. No outro dia eu contei 22 em uma homilia de duas páginas e meia. Recentemente me dizia uma amiga sua argentina que Bergoglio é um grande conhecedor da Bíblia e que nunca lê um texto que não tenha sido trabalhado e escrito por ele mesmo. Mas, além do mais, eu suspeito que o faça para eliminar qualquer dúvida, de dentro: quer deixar claro que a Igreja que ele sonha e prega – a da periferia, a dos pastores com cheiro de ovelha – não é outra que a das origens. Que em vez de uma teoria nova o que está fazendo é tirar os escombros de cima do discurso das origens.
ZENIT: Que outras considerações poderia fazer sobre estes dois anos de pontificado?

- Pablo Ordaz: Existe um resultado claro. Independentemente de que o papa Francisco seja mais agradável para uns do que para outros, o que sim fica claro é que colocou a Igreja no centro do debate em todo o mundo. A sua mensagem é escutada pelos de dentro e os de fora e, além disso, está utilizando a poderosa maquinária diplomática do Vaticano para mediar conflitos como o do Oriente Próximo ou a exitosa aproximação entre EUA e Cuba. As vezes é preciso distanciar-se de um quadro para ter a visão mais nítida, e as pequenas guerras de poder que continuam existindo no Vaticano são “peccata minuta” em comparação com todos os aspectos interessantes do ainda curto pontificado de Jorge Mario Bergoglio.


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